terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Holocausto Social


Você já sentiu peso na consciência? Eu já conhecia o remorso, por causa de outras situações. Mas agora, por se tratar de algo um pouco mais sério, acho que é peso na consciência mesmo... Deito na cama e por mais que não queira, o “assunto” fica martelando na minha cabeça, me impelindo a tomar uma providência. Uma que eu considere moralmente certa pelo menos...

Ser faxineiro em aeroporto não é tarefa das mais agradáveis. Fato. Mas nem por isso deixo de me orgulhar de minha função. Participo da engrenagem da sociedade com o papel que está a minha altura. A vida é assim...

Ao menos foi esse (o papel) que me foi concedido na entrevista de emprego. Trinta e sete anos, analfabeto... não posso exigir muita coisa mesmo...

Estando “confinado” quase que integralmente a minha jornada inteira de trabalho nesse espaço, acabo ouvindo muita coisa. Desde conversas informais, relatos de traições, muita política, futebol, etc. Fico portanto, sabendo de tudo um pouco sem ter necessariamente que saber ler um jornal. Agora, quanto a integridade das informações...

Um exemplo de política; Judeus que passam por aqui, criticam demais um tal de Mahmoud Ahmadinejad, presidente do Irã. Mas é de se pensar. Só porque o homem não acredita no chamado Holocausto, é de se imaginar que os judeus pouco simpáticos seriam para com esse figurão... Massacres na Palestina (eles, os judeus) pouco se referem, e porque não é mesmo? Cada qual sabe onde seu calo dói, essa que é a verdade.

Dilema moral, eis o que vivo agora... semana passada, um figurão desses ,que sequer olham na sua cara, devido a sua posição social ser taxada por ele, como superior, entrou aqui no banheiro e esqueceu sua pasta dentro de um dos boxes privativos. Na hora eu não percebi, mas lembrei há quem pertencia. No interesse de achar um documento de identificação dentro da pasta, para minha surpresa, me deparo com muitas notas. Mas não eram “notas brasileiras”, eram de um cor esverdeada, eram dólares! Uma pasta recheada de dólares!

Na hora, confesso que o “demo” falou, e falou alto dentro da minha cabeça. Tamanho volume de dinheiro ajeitaria por completo minha vida. Meus filhos teriam os tão sonhados estudos, poderia dar um padrão de vida digno para minha mulher, viajar pelo Brasil afora... enfim. Viver.

Mas só de pensar que se isso acontecesse comigo, se eu tivesse perdido a maleta... lágrimas já ameaçaram cair pelo meu rosto. O que fazer Senhor?

No dia seguinte, na porta do shopping, percebo um aviso colado e peço para um amigo de trabalho lê-lo para mim: Procura-se maleta executiva, paga-se bem. E lá estava a cara do dono lateralmente ao anuncio...

Já na minha rotina diária, por volta de meio-dia, eis que o tal “figurão” entra novamente no banheiro, desta vez, de mãos abanando. Criei coragem e puxei assunto, perguntando se ele realmente era o dono da maleta desaparecida. Após confirmação, perguntei, na lata:


- Escuta, com sinceridade, independente do que tenha dentro, se fosse VOCÊ que tivesse achado a maleta, VOCÊ devolveria?

Ficou me encarando por um longo período, meio que digerindo e confabulando uma resposta e soltou:

- Não, e creio que quem achou não vai devolver também. Estamos no Brasil, um país de mortos de fome, desonestos, corruptos... o país do mensalão! Mas o que um pobre coitado como você sabe dessas coisas não é mesmo? Faxineiro...


Aquele dinheiro que a principio parecia ser solução, agora era um peso na minha vida. Uma repulsa sem fim me invadiu... e confesso que deu vontade até de queimá-lo, só para fazer desgraça com o tal “doutor”. Mas isso seria muito baixo, mais baixo do que a atitude dele para comigo...

No fim do expediente, antes de ir embora, passei na administração do shopping e entreguei a maleta. Coloquei apenas um bilhete no seu interior, bilhete esse que um amigo teve que escrever para mim...

- Caro doutor, honestidade ainda existe nesse país, e o primeiro exemplo quem tem que dar somos nós mesmos. Fazer a nossa parte. É preferível deitar com a cabeça tranqüila no travesseiro, do que desfrutar de algo que não lhe é digno. Reflita nas suas atitudes e naquilo que fala para aqueles que têm posição trabalhista/social menor do que a sua. Esse Holocausto Social é mais tênue do que parece. Um dia no cume, outro dia no abismo, nunca se esqueça! Assinado, faxineiro.

Hoje a televisão veio até o shopping me procurar, inclusive o “doutor”, para me oferecer uma recompensa pela devolução, mas neguei atenção para ambos. “Confete” por ter feito minha obrigação eu dispenso...agora, um pouco mais de respeito e consideração, isso sim, é sempre bem vindo!

Guttwein, T.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Tem de ser assim?


Recentemente conheci um cara no trabalho. A primeira impressão é a que fica, e a que ele me passou foi muito boa. Não só a impressão, mas o caso é que ele tem umas “paradinhas” muito boas também...

Ando muito estressado com minha rotina, conciliar trabalho e faculdade não tem sido nada fácil... e por isso talvez, que essa nova amizade tenha vindo em momento mais oportuno. Quanto aos fins justificarem os meios, já é outra história...

Certa feita resolvemos dar uma escapada rápida do trabalho e andar por ai de carro. Ele dirigia muito bem, cortando os demais carros da via como um piloto profissional... me dizia que cinto de segurança era para os fracos e que sua tal “paradinha” acelerava seus reflexos. Parecia funcionar muito bem. Não sabia onde estávamos indo, mas íamos muito rápido.

Chegamos a uma bocada muito feia. Emaranhados de fios por toda parte; Gambiarras de canos desviando água da via pública e tudo mais. Uma favela. Ele desce do carro e caminha morro acima. Pediu-me para esperar no carro, que seria rápido. Passados 30 minutos, ele retorna com algo na mão. No carro mesmo, começa a enrolar uma espécie de cigarro, dois, aliás. Um para cada.


Começa aqui meu declínio...


Cerveja, bebidas no geral, nunca tive problema. Tudo na social é claro, esporadicamente. Mas isso era novidade. O cheiro era entorpecente... Experimentei para não fazer desfeita. Ele era legal, estava compartilhando seu “segredo” comigo, não havia como eu dizer não...

Quando tossi forte e esfreguei os olhos, pois a fumaça havia entrado em meus olhos, ele caiu no riso. Falou que era normal e que eu iria me acostumar... que a sensação mais tarde seria boníssima.


No primeiro dia, confesso que não gostei muito. Aquele cheiro não queria sair das minhas roupas de jeito algum. Sem contar a dor de cabeça que veio em seguida. Minha cabeça parecia um turbilhão.
Mas os demais dias... Fluidez.

Anteriormente, a Lei era mais agressiva com os da “nossa turma”. Não existia essa história de “usuário”. Se você fosse pego, já era, cana! Agora hoje, é praticamente festa! Posso até ser fichado, mas serei enquadrado como mero “portador de” e não como um malvado traficante. Viva João Estrela, meu Ídolo Mor!

Acho que, independente da criação que a gente tenha recebido, dos exemplos que tivemos dentro de casa, sejam liberais ou autoritários, nosso caminho tem de ser trilhado de forma única. Sinuoso, reto, não sei... mas temos de escrever nossa história como bem entendemos. Hoje estou numa etapa nova da minha vida. Maléfico ou não, sendo um estágio, um trampolim, ou uma fuga para um mundo imaginário, tenho de ir para algum lugar... chegar sabe-se lá onde...
“Fernando”, após se iniciar com a simplória maconha, foi rapidamente apresentado para a “rainha” cocaína, afinal, dinheiro nunca foi problema. Deu o “azar” de ser preso sem ter ainda concluído sua faculdade. Regalia alguma lhe foi concedida. Preferiu pegar um lençol e dar cabo de sua vida, no chuveiro da penitenciária, do que ser abusado sexualmente novamente por outro de seus companheiros de cela...
Guttwein, T.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Cara ou Coroa... é você quem decide!

Irônico ou não, esta tudo em suas mãos...

Tem momentos na vida que a gente pára e se pergunta: “O que foi que eu fiz com a minha vida?”
Nossa missão é andar bem pelo labirinto, cruzar os obstáculos, viver ano após ano, definir objetivos e encontrar o fim. Na verdade, o fim que é o começo: de realizações, satisfação e felicidade.

Porém, nem sempre as coisas saem como planejamos. E tudo começa a tomar rumos que não prevemos. Enfim, ao olhar ao redor, a sensação é que tudo “empacou”. Você ficou totalmente “sem saída”. Já se sentiu assim?

Certa feita, li em uma crônica – “Nós somos a soma das nossas decisões”. E hoje, tal frase martela em minha mente de forma explosiva. Se formos analisar cada ponto em que estamos ou chegamos, este se deu por cada escolha feita por nós.

Claro, só escolhemos determinado caminho por julgá-lo o melhor no momento da decisão. Mas, é frustrante percorrer uma jornada, chegar ao ponto e depois admitir: - “Fiz a escolha errada”.
Para quantos de nós a vida deu inúmeras opções... perdemos o sono para acertar. Só que o tempo passa e vem a constatação do erro. Nas tristezas, na falta de motivação, no stress, na falta de sentido... é como se em nossos dias a felicidade se resumisse em querer sempre mais: mais reconhecimento, mais tempo, mais férias, mais dinheiro, mais tudo! Pequenos dissabores que pontuam o dia-a-dia tornam-se obstáculos para a almejada felicidade.

Seria ideal se conseguíssemos ser diferente em cada escolha. E quando digo “diferente”, digo em mudar nossa essência mesmo. Mas, (in)felizmente, as escolhas são espelho do que realmente somos, e por muitas vezes, nos permitimos errar, levando a vida (sem querer) para onde não queremos.

E é assim que persistimos no aprendizado da vida: nossas escolhas devem ser 100%! Porém, com 50% de chance de acertar e 50% de chance para errar. Por mais que não queira, a escolha será sempre sua... a consequência, talvez.
Ariane Aleixo

domingo, 6 de dezembro de 2009

Por que não cheira bem?



Essa é profunda e vale a reflexão, porém, só após uma leitura completa, dê-nos seu ponto de vista: até que ponto o ser humano pode evoluir imerso em cultura? Óbvio, muitíssimo, vocês vão me dizer. Mas há zonas sombrias e ambíguas nisso tudo...

Hannibal Lecter é meu ponto de partida para um devaneio que gostaria de compartilhar com vocês. Um personagem absurdamente culto e inteligente, porém, um assassino sem limites e sem igual.

Acho que nunca vi um personagem com tamanho requinte como esse. Admira a cozinha de alto padrão, crítico de música erudita (sinfônica) e por ai afora.

Reparo que, ao menos no cinema, em inúmeras literaturas, e até no teatro, se um personagem é culto, é porque ele revelar-se-á (em algum momento) como um desequilibrado, como um ser perverso com tendências sórdidas, com algum impulso reprimido para o assassinato em série... porque cultura parece não cheirar bem!?

Muita gente por sinal, teme a cultura para seus filhos homens. O menino normal/sadio, na cabeça de certos pais, deve mesmo é jogar bola e correr atrás de uma pipa, e não ficar lendo um livro, ouvindo ópera ou indo à exposições de arte. É um péssimo sinal para tais pais, quando isso acontece...

Agora, não sei configurar se isso é um problema individual do "brasileiro médio" (da concepção desses pais apenas), se é um problema de criação que já vem enraizado desde a infância e que é passado geração após geração, ou se devemos caminhar pro lado da psicanálise...

Mas uma coisa eu posso lhes afirmar com absoluta certeza: quando falarmos em Cultura, qualquer comodismo e tranquilidade confiante, vai desconfigura-lá. Cultura "meins kamerads", deve ser amiga da dúvida e inquieta por natureza. Incerteza, mobilidade, instabilidade, complexibilidade e oscilação... simples assim!
Guttwein, T.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Visão Macro...

E que presente...

Ahhh, o natal está próximo! E todo aquele altruísmo e cordialidade também... a época onde até as rivalidades com os vizinhos ficam de lado, época de viagens que não cabem no orçamento e claro, época de presentear!

Mas afinal, por que oferecemos presentes? Talvez para criar uma satisfação sem igual no presenteado, para fazê-lo feliz ao extremo! (óbvio demais).

Talvez, vamos um pouco mais devagar...

Por exemplo, é bem possível que a troca que ocorre no natal seja como um gigantesco “potlatch”, uma maneira efusiva de literalmente torrarmos os recursos que acumulamos durante o ano ( dinheiro, bens e até tempo) , com o intuito único de manifestarmos nossa riqueza (pequena ou grande) aos outros, ao céu e até à nós mesmos.

Não generalizo, mas a minha maneira de ver, presenteamos nossos amigos, parentes e até inimigos por razões que,acreditem, pouco tem a ver com a intenção de fazer o outro verdadeiramente feliz. Existem os presentes pedagógicos e os paternalistas... ou seja, para aquele sobrinho que não é muito chegado a uma leitura, dá-se um vale-livros e para o maridão que mais se assemelha a um hipopótamo, uma camiseta tamanho “P”. Assim como há também, os presentes que só vem com um intuito: Intimidação. “Este aqui meu querido(a), você nunca poderá/conseguirá retribuir”.

Mas tem o reverso da medalha...

Por um acaso, qualquer presenteado saberia escolher seu próprio presente, caso lhe concedessem essa chance, por mais generoso e bem intencionado que seja seu presenteador? (Na sinceridade!!). Basta fazer um exame de consciência, e posterior, no seu armário ou estante, e olhar o tanto de trapos e quinquilharias que se encontram por lá! Isso só prova que nossas escolhas, muitas vezes são tão (ou mais) incertas do que as dos que tentam nos presentear.

Quer saber, hoje em dia, quando alguém que amo verdadeiramente me presenteia, não mais espero aquele objeto que cobiço a um bom tempo – óbvio, se vier, soltarei rojões! – mas, esse tipo de coisa, posso eu mesmo, ir lá e comprar, sozinho. De quem me ama, espero receber algo que, até então, e isso literalmente, eu não sabia que precisava até então.

O presente autêntico (verdadeiro) no fim das contas, é aquele que me revela meu próprio desejo.
Guttwein, T.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Realidade-crônica, Mariolas (e Tragédia...)


Foto: Print Screen do filme "Rota Comando"

Mais ou menos 23:50hs de um domingo. O calor ambiente já bastaria... 28° creio eu... mas dentro da viatura cinza parece duplicar a sensação térmica. Vidros abertos anulam pouco a tal sensação sufocante, infelizmente...

O caminho de hoje é um pouco diferente, uma vez que denuncias de moradores das cercanias, à cerca de traficantes, tem se intensificado no batalhão. Resolvemos apurar e não demorou muito para darmos de cara com uma 1ª ocorrência. E uma das mais marcantes em minha carreira.

Ele tinha apenas 14 anos. Iniciou-se cedo no tráfico o tal C.A.A. Não era viciado, nunca tinha usado drogas, mas resolveu entrar para essa vida devido ao lucro. Ao menos foi isso que ele nos alegou. Vender maconha ou cocaína dava muito mais lucro do que vender mariolas ou drops nos semáforos. Seus fornecedores eram ponta-firme e gostavam dele... Sempre se esforçou, e nunca desviou dinheiro,pois era muito honesto.

Perguntei a ele o motivo de ter entrado nessa vida... (tenho filho, e gostaria de entender o que se passa na cabeça desse jovem). A resposta foi concisa: Seu pai foi morto pela polícia num tiroteio contra ladrões de banco, em plena Av. Paulista. Era limpador de vidros na região e fazia bicos para sustentar a família; não tinha relação alguma com drogas... apenas ia passando e levou um balaço.

Com a mãe enferma, de uma trombose, mais 3 irmãos menores, ele teve friamente que assumir as rédeas da situação. Confessou que, por inúmeras vezes pensou em ser engraxate, ou vender os citados drops, ou coisa equivalente a sua condição de menor semi-analfabeto.

Mas certa feita, conheceu um rapaz, apelidado Vinagre, um pouco mais velho que ele... tinha 21 anos. E foi o tal Vinagre que o iniciou no tráfico. O lúdico da coisa, é que seu docente na vida marginal, era traficante e viciado, ao contrário dele. Morreu numa briga por estar devendo dinheiro aos “amigos solícitos” do tráfico.

Tinha muito bem definido na cabeça que, - o vendedor não pode ser consumidor da própria mercadoria - não nesse ramo. Acreditava piamente que estava safo... ganhava seu dinheiro e não pagava o caro preço da dependência.

Ficou preso por um bom tempo numa delegacia especializada para menores. Tornou-se mais um escravo do vício...
Guttwein, T.